ORGIA OU O HOMEM QUE DEUS CRIA (Direção de João Silvério Trevisan, 1970)

Sinopse: Pobre agricultor mata o pai (Candeias) e sai em direção à cidade, encontrando diversos tipos com os quais pretende desbravar o Brasil como um homem que violenta e assassina um homossexual, um escritor (Bernardet) que se enforca após queimar seus livros, um travesti, um anjo, um rei, um padre, duas prostitutas, dois índios, um homem grávido. Na travessia até chegar à cidade eles encontram um local com mesa farta, onde o rei morre de indigestão. Mais adiante num cemitério, o homem grávido pare seu filho para a alegria geral. Enquanto todos festejam, os índios devoram a criança. Elenco: Pedro Paulo Rangel, Ozualdo R. Candeias, Janira Santiago, Fernando Benini, Jean-Claude Bernardet, Sérgio Couto, Marcelino Buru, José Fernandez, Neusa Mollon, Marisa Leone, Jairo Ferreira, Cláudio Mamberti, Sebastião Millaré, Antonio Vasconcelos, Zenaide Rios, Mário Alves, José Gaspar Curiosidade: - Orgia é puro carnaval tropicalista. Não tem começo, meio ou fim. Vemos um grupo, que vai se juntando ao acaso, com a intenção comum de achar o lugar onde se encontra o Brasil. “O país está na cidade?” — ouve-se alguém perguntar. O nonsense da narrativa, os personagens alegóricos, o longo trajeto que acaba por levá-los a um cemitério, tudo se fixa na inversão carnavalesca de tipos conhecidos do cinema brasileiro: o camponês mata o pai enlaçando-o como um animal, o caminhoneiro se livra de um pervertido sexual e cai no mundo, a baiana é um travesti mulato que declama trechos de Oswald de Andrade, o pai-de-santo anda de cadeira de rodas segurando a taça da Copa de 70, o intelectual fala uma língua incompreensível e se enforca, o padre e a freira rezam a primeira missa do Brasil, o cangaceiro está grávido e dá à luz em meio às tumbas de um cemitério, os índios cometem antropofagia. Sob a câmera frenética de Carlos Reichenbach, essas figuras desfilam por um mundo onde o desespero é folia, é experiência lisérgica e homoerótica, com direito a marchinhas típicas povoadas pelos urros, gemidos e murmúrios dos corpos que se arrastam pela terra em busca de transformação. Hoje, era do realismo fake da televisão, Orgia causa impacto ao trabalhar com um tipo de representação alegórica e gutural, conseguindo dar conta de traduzir o Brasil. (Texto de Guiomar Ramos)
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